quarta-feira, 30 de junho de 2010

Intelectuais da Periferia



Por João Batista Soares de Carvalho

Tenho lido sobre o aparecimento de três grupos de atores sociais ligados ao RAP e ao Hip-Hop. Os operadores originais (b.boys, b.girls, rappers, grafiteiros, djs, etc.); pesquisadores do movimento (oriundos da periferia, é claro!) e escritores da literatura marginal. Esses três grupos têm um papel importante como produtores de um conhecimento da periferia, para a periferia. Eles estão projetando, como intelectuais da própria camada social, uma sociedade na qual os que estão na periferia comandarão. Os impreendimentos intelectuais e comerciais desses três grupos apontam para isso. Eles passaram a ganhar (conhecimento e dinheiro) com o RAP e o Hip-Hop.

Tomemos como exemplo a burguesia, que quando era revolucionária, também tinha seu corpo de intelectuais, que projetou e estabeleceu seu rumo em direção ao poder. Porém, ainda existe algo que está atrapalhando o favelado, aquele que é de periferia, a perceber o RAP e o Hip-Hop como cultura de tomada de consciência por parte do povo pobre.

Existem muitos, inclusive entre os da periferia, que confundem, que se equivocam e até deturpam a cultura. Tomam, principalmente o RAP, como trilha sonora do crime. Por isso, é importante que mais integrantes mostrem que as ações do Hip Hop e da Literatura Marginal podem ser instrumentos de transformação política e social, que podem contribuir para a formação de um grupo intelectual da periferia, em defesa dos da periferia, pela libertação e consequente subversão da ordem social.

Têm muitas pessoas trabalhando para isso, seja no palco com o microfone, seja nas aulas junto aos jovens, seja escrevendo e expondo suas ideias.

Escreverei mais sobre a força dos intelectuais da periferia.

terça-feira, 29 de junho de 2010

A importância do funk para o jovem da periferia

Por João Batista Soares de Carvalho.

Nesse mês de junho dois alunos (Edson e Maxswell) da 8ª Série da EMEF Antônio Carlos de Andrada e Silva da Vila Jacuí, Zona Leste da cidade de São Paulo, me procuraram para que eu falasse sobre a importância do Funk para os jovens. Eles estavam produzindo um programa de rádio para um projeto do CDC Tide Setúbal na escola. Esses alunos fizeram um levantamento e descobriram que o ritmo preferido dos jovens estudantes dessa escola é o funk.

Perguntaram-me sobre a história do funk e resumidamente eu resgatei um pouco da origem do ritmo nos Estados Unidos marcado pelas batidas e pelos metais, destacando a figura de James Brown. Depois falei um pouco sobre a apropriação da Miami Bass feita pelas equipes de bailes do Rio de Janeiro até a criação de letras sobrepostas a essas batidas mais eletrônicas.

Sei que alguns esperavam que eu fizesse uma crítica ao funk carioca. Só que o funk não é uma coisa só, apresentando uma gama de letras para todos os gostos: românticas, pornográficas, apologias, políticas, afirmativas. É só escolher a que mais agrada ou não, pois ninguém é obrigado a gostar.

Perguntado sobre porque o dos jovens gostarem tanto do funk eu digo que o ritmo agrada muito, mas não podemos negligenciar o fato da letra chamar muito a atenção. A letra é transgressora principalmente permitir que um jovem de periferia, afrobrasileiro, pobre (que nunca teve voz e vez) fale o que pensa.

Defendo na entrevista que o funk atual do Brasil é alvo de um forte preconceito de ordem racial e classista. O problema do funk não está no que se canta e sim em quem canta. Se a mesma música dos funkeiros for interpretada por algum cantor da “MPB”, provavelmente não receberá as mesmas críticas que recebem os jovens pobres e negros de periferia que ousaram emitir opinião de forma pública.

O que procuro destacar nessa entrevista é o fato dos afroamericanos e afrobrasileiros usarem o funk para expressar sua condição de classe e de etnia, expressar a luta pela voz, pelo direito de expor sua visão de mundo.

Ouça o áudio da entrevista:

domingo, 27 de junho de 2010

“Sonhei com esse dia” - Mano Brown no Fantástico

Por João Batista Soares de Carvalho

“Sonhei com esse dia (...)” é um trecho da letra escrita por Mano
Brown e acrescentada a música Umbabarauma de Jorge Benjor. Essa
parceria inaugurou uma grande polêmica porque marcou a primeira
aparição planejada de Mano Brown no Programa Fantástico da Rede Globo.
Essa aparição gerou uma enorme repercussão e pode representar as
transformações pelas quais passa o hip hop, e conseqüentemente o RAP,
nessa década.
Alguns, mesmo ignorando a razão e não querendo saber das
justificativas, viram esse ato como uma prova de que o rapper se
vendeu para a “mídia”. Por outro lado, se analisarmos o clipe,
produzido pela Nike, notamos que Mano Brown não aparece de qualquer
forma. Normalmente um jovem negro aparece nos principais veículos
televisivos tachado como criminoso e armado. No clipe, Mano Brown
apresenta outras armas que a periferia está aprendendo a usar. Mano
Brown representa, no clipe, o negro criador, o escritor, o compositor,
o músico. Em vários trechos do vídeo ele aparece manipulando a letra,
usando um caderno e uma caneta. Como ele já cantou várias vezes, essas
deveriam ser as armas dos pobres, dos pretos de periferia, favelados.
Mano Brown não precisa justificar nada. Não fez nada de errado. Não
foi incoerente. Principalmente porque se o Jorge Benjor veio a
quebrada, no reduto de Mano Brown, cantou para o público do RAP, foi
justo Mano Brown retribuir. Além disso, não foi de graça: toda a renda
da venda dessa música será revertida para o projeto social criado por
Mano Brown no Capão Redondo.
Como disse um colega meu: “Agora favelado tem razão pra pagá de Nike,
sobro uns cobre pra nóis!”